Mas não um novo concreto que está em fase de testes na Universidade Técnica de Delft, na Holanda.
O concreto autocurativo contém bactérias que produzem calcário e são ativadas pela água da chuva. Os esporos da bactéria - adicionados à fórmula do concreto - ficam dormentes até serem atingidos pela água da chuva corroendo as estruturas do material.
Então, a bactéria, que é inofensiva, produzirá calcário e "curará" as rachaduras causadas pela água.
"Vimos em laboratório o conserto de rachaduras de 0,5 mm de largura," o que é mais do que o estabelecido por normas técnicas, explica o microbiologista Henk Jonkers, autor do projeto.
Se a ideia der certo, Jonkers espera comercializar o produto daqui a dois ou três anos, após testes externos e em diferentes tipos de concreto.
O principal desafio é garantir que o agente "curador" seja forte o suficiente para sobreviver ao processo de mistura do concreto. Para isso, é preciso aplicar uma cobertura às partículas biológicas, algo que encarece o processo.
Mas, ainda que o agente aumente em 50% o custo do concreto, isso ainda representará apenas 1% a 2% do total dos custos de construção. Já a manutenção de concreto deteriorado representaria um custo maior, diz Jonkers.
Conserto com luz
Não é só para o concreto que os cientistas buscam desenvolver capacidades de autoconserto.
Uma aplicação possível dessa propriedade seria em smartphones e tablets, que tão comumente sofrem riscos e quebras na tela.
A equipe do professor Ian Bond, da Universidade de Bristol, na Grã-Bretanha, fez um estudo de viabilidade a respeito de um problema parecido, que afeta vidros à prova de balas. "O vidro suporta a bala, mas racha", explica.
Bond, Ian Bond, avaliou a possibilidade de mesclar com o vidro alguma substância que preencha as rachaduras. "Esse mesmo princípio poderia ser aplicado em escala menor", em aparelhos eletrônicos, acrescenta o professor.
Ele acredita que um sistema com um gatilho - talvez a luz do Sol - também possa funcionar. Óculos, por exemplos, poderiam ser fervidos para consertar riscos ou rachaduras na superfície.
"Você não pode fazer isso com seu celular, mas talvez possa colocar o aparelho na janela, sob o Sol durante 24 horas, para consertar alguns riscos".
Christoph Weder, do Instituto Adolphe Merkle, na Suíça, acredita que dá para ser mais prático, não precisando depender do Sol.
Ele e seus colegas estão desenvolvendo materiais que se reparam sozinhos com luz - com qualquer luz, mesmo a de uma lâmpada.
No caso dos smartphones, trata-se apenas de um projeto. Mas já existe um spray que pode ser aplicado em motores para prevenir ou minimizar vazamentos, caso eles sejam atingidos por balas de baixo calibre.
Há três camadas no spray, e as duas exteriores são feitas de um plástico especialmente formulado que se espalha ao redor do projétil. No meio do plástico há uma camada especial com um componente absorvente. Quando esse componente entra em contato com o combustível, forma-se uma camada seladora.
Circuitos de metal líquido
Os primeiros estudos sérios sobre esse tipo de tecnologia começaram nos anos 1960, por pesquisadores soviéticos. E, em 2001, um estudo da Universidade de Illinois (EUA) deu o pontapé para avanços nessa área.
Os pesquisadores injetaram um polímero semelhante ao plástico com cápsulas microscópicas contendo um líquido de agentes curativos. Se o material rachasse, isso ativava a ruptura das cápsulas e a liberação do agente curativo. E uma reação química reparava o produto. O polímero é capaz de recompor cerca de 75% de suas características originais.
Na última década, essa equipe avançou e criou um circuito elétrico que se autoconserta quando danificado. Microcápsulas no circuito liberam metal líquido em caso de danos, restaurando a condutividade.
O grupo já está comercializando seu trabalho por intermédio da empresa Autonomic Materials, que obteve investimentos de cerca de US$ 4 milhões. Segundo o executivo-chefe Joe Giuliani, as primeiras aplicações das microcápsulas devem ser em tintas e adesivos para serem usados em ambientes afetados pela corrosão.
O setor de petróleo e gás pode ser beneficiado: produtos autocurativos podem ser úteis em plataformas, em oleodutos e em refinarias.
Scott White, do Instituto Beckman da Universidade de Illinois, opina que o conserto em equipamentos esportivos e aeronáuticos, por exemplo, é um "alvo de médio prazo" para a ciência.
Segundo ele, todo o conceito de autoconserto tem despertado grande interesse na última década, com cerca de 200 estudos acadêmicos publicados a respeito no ano passado. Há projetos em direções distintas, como polímeros e compostos que se autorreparam.
Aviões com cicatrização
A inspiração, em alguns casos, é o sistema vascular humano, que depende de uma rede capilar para transportar agentes curativos ao local de feridas no corpo. Ao mesmo tempo, exploram a natureza reversível de alguns compostos químicos para incorporar neles essas habilidades curativas.
Que o conceito de usar veias artificiais para permitir que materiais se autoconsertem é viável ficou bem demonstrado em um trabalho apresentado em Janeiro deste ano, pelo próprio grupo da Universidade de Illinois.
Bond, por sua vez, está desenvolvendo uma rede vascular baseada em fibras ocas, que transmitiriam agentes curativos por meio de polímeros. Sua ideia final é "uma aeronave autocurativa".
Seu colega Christopher Semprimoschnig quer mais, e já fala em construir uma espaçonave capaz de se autoconsertar do impacto de meteoritos ou lixo espacial.
Tamara Dikic, da Universidade de Tecnologia de Eindhoven, na Holanda, propõe o uso dos materiais que se autoconsertam em aplicações mais práticas e imediatas: carros que não precisam ser lavados e celulares sem manchas de dedo.
A ideia de imitar a cicatrização biológica é minimizar danos em elementos estruturais de aviões, que podem ser alvo de rachaduras.
Bond continua trabalhando para superar alguns obstáculos enfrentados por sistemas vasculares: passar de microcápsulas para uma rede bi ou tridimensional, por exemplo, é um grande desafio industrial. Outro problema é garantir e controlar o fluxo do líquido curativo pelo material.
"No caso do sangue, ele só coagula quando está fora da veia", diz o professor. "Queremos algo assim, já que o perigo de compostos químicos simples é de que ele solidifique toda a rede capilar."
Fonte: BBC
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