É bom lembrar que modelos de controle e restrição de acesso não são exclusividade do país oriental. Empresas utilizam esse tipo de censura para filtrar o que seus funcionários acessam na grande rede. No mundo corporativo este controle tem intenção de reduzir os riscos de violação de dados, a exposição a pragas virtuais e, é claro: aumentar a produtividade, evitando que o funcionário “se distraia” com assuntos alheios ao trabalho.
Neste caso, o meio mais simples de filtros é utilizar um servidor denominado proxy, pelo qual passa todo o tráfego da rede. Por ali é possível barrar o acesso a certos endereços e também protocolos específicos, como os do MSN, FTP ou de clientes de transferência de arquivos como BitTorrent, Kazaa e afins, como mostra a ilustração abaixo.
Esse controle é automático e um administrador de redes só altera as regras quando precisa incluir ou retirar algum filtro. Às vezes, por exemplo, a empresa decide utilizar um mensageiro como ferramenta de comunicação interna, e os administradores são obrigados a mudar as regras de acesso à rede. Em outras situações, a chefia pode identificar que os funcionários passam muito tempo em um site “inútil”, como o Orkut, e acabam fechando as portas para a página.
Mas o que o governo chinês usa é algo muito mais potente do que um mero filtro. Por meio do projeto denominado “Jin Dun”, (escudo de ouro, em português), os chineses criaram uma enorme barreira para controlar os dados trafegados entre o mundo e qualquer computador ligado à rede naquele país. Não se sabe ao certo quanto foi gasto para impor essa censura, mas fala-se em custos exorbitantes, da ordem dos bilhões de dólares. Mais de 600 mil computadores e cerca 30 mil funcionários trabalham na manutenção do grande “firewall” da China.
Mas como é possível essa estrutura monitorar tudo que trafega na internet? A expressão “é simples” não se encaixa na resposta, mas vou tentar simplificar:
Todo o tráfego de internet da China chega ao país por 17 gigantescos cabos submarinos, conectados diretamente a uma única central de controle responsável por distribuir o acesso à grande rede no país. Por ser centralizado, o monitoramento do conteúdo fica “menos complexo”.
A partir desta central, os chineses utilizam diversos meios para bloquear o acesso ao conteúdo considerado indesejado.
As fases do bloqueio:
Controle de domínios– Existe uma lista criada pelo governo contendo os endereços dos sites que não podem ser acessados. Esta lista não é divulgada, e está em constante mudança. Quando o internauta digita uma URL desta lista, o acesso simplesmente não acontece.
Restrição de termos – Alguns sites não são bloqueados, como a Wikipedia, por exemplo. Porém, certas palavras-chave digitadas neste site são. Este controle é mais efetivo e faz uso da imensa capacidade de processamento dos computadores do sistema, que analisa o conteúdo dos sites requisitados. Ao encontrar um termo previamente definido como proibido, o acesso ao site é bloqueado.
Punição total – Se o usuário insiste em tentar acessar os sites bloqueados, ele sofre represálias, tendo seu acesso completamente bloqueado por um tempo pré-determinado. Caso insista, pode receber uma “visita” de autoridades policiais.
Bloqueio parcial de conteúdo – Existem restrições parciais de conteúdo, nas quais alguns sites são carregados parcialmente, mas alguns elementos podem ter conteúdo proibido – como vídeos, áudios ou textos - e simplesmente não serão carregados.
A atualização das listas de sites e termos é feita por milhares de consultores que analisam os sites mais acessados, procurando por conteúdos que são considerados indesejados pela censura do país. O governo chinês, no entanto, não confirma a utilização desse método.
Para você experimentar como é viver essas restrições, recomendo o acesso a este site: http://www.websitepulse.com/help/testtools.china-test.html. Ele tem uma ferramenta conectada a servidores dentro da China, que simulam o acesso a um site. Observe a animação abaixo:
Repare que o acesso ao g1.globo.com ocorre normalmente – indicado pelo campo “status”, que destaquei com uma seta. Mas o acesso a www.freetibet.org não é permitido - o “status” da conexão aparece como “couldn’t connect to host” (em português, “não foi possível conectar com o host”).
A grande maioria dos internautas chineses e, claro, todos os estrangeiros que por vários motivos estão no país, vivencia de forma impositiva esta situação, sem ter meios e conhecimentos técnicos para buscar alternativas de acesso livre e irrestrito à navegação na grande rede.
Porém, alguns internautas fazem uso de diversos mecanismos para buscar um meio de burlar o bloqueio. O mais comum seria o uso de servidores de proxy, que mascaram o acesso fazendo com que o sistema chinês não consiga rastrear por onde o usuário está navegando. Esse modelo, contudo, é relativamente fácil de ser descoberto, e os servidores de proxy geralmente também acabam bloqueados.
Outro recurso é conectar-se a redes Privadas Virtuais (VPNs), muito comuns no meio corporativo para possibilitar que os funcionários acessem sistemas internos de qualquer lugar do mundo e de forma segura.
Aliás, falando em meios de ter acesso irrestrito à rede, não posso deixar de falar da lista de “conselhos práticos” elaborada pela organização Repórteres sem Fronteiras (RSF) e divulgada há cerca de 10 dias para os jornalistas que estão trabalhando na cobertura dos Jogos Olímpicos de Pequim.
Eles sugerem o uso de servidores proxy e redes VPN, que eu já citei aqui, mas dão outras dicas, como o uso de criptografia nas comunicações instantâneas e trocas de e-mail.
Eles recomendam também o uso de programas antivírus e antispyware, bem como o uso de senha no usuário do sistema operacional. Também é importante não deixar o computador desbloqueado em locais públicos ou mesmo no quarto do hotel.
A lista totaliza 9 conselhos, e o advogado e blogueiro Xico Malta traduziu tudo para o português na página do jornalista esportivo Vitor Birner. Vale a visita.
Para finalizar: o bloqueio existe, e também existem meios de contorná-lo. As tecnologias são ilimitadas e a internet é um recurso maravilhoso no que diz respeito ao acesso à informação e democracia. Infelizmente existem decisões políticas que fazem um uso controverso de recursos avançadíssimos da tecnologia. Meu objetivo aqui foi mostrar como ele é feito e como está sendo contornado.
Fonte: Blog do Fernando Panissi
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