sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Pesquisa cria células-tronco reprogramadas e personalizadas

Pesquisadores nos Estados Unidos parecem ter finalmente realizado uma das promessas mais antigas — e, até hoje, frustradas — dos estudos com células-tronco. Eles conseguiram transformar células da pele da portadora de uma doença neurodegenerativa severa no tipo de neurônio que é afetado pela moléstia.

Agora, deve ser possível estudar o problema em células exatamente idênticas às de pacientes humanos, aumentando as chances de entender o que está errado com elas e consertá-las.

Neurônios motores, justamente o tipo de célula com problemas em pacientes com esclerose lateral amiotrófica (Foto: Kit Rodolfa e John Dimos/Universidade Harvard)

“Nós ficamos especialmente animados porque a nossa paciente é muito idosa [tem 82 anos], e muita gente duvidava da possibilidade de reprogramar as células de alguém com essa idade”, declarou em entrevista coletiva telefônica Kevin Eggan, do Instituto de Células-Tronco de Harvard. Eggan e seu colega Chris Henderson, da Universidade Columbia, são os principais autores do estudo, publicado na edição desta semana da revista especializada americana “Science”.

De volta para o passado

De certa forma, o trabalho de Eggan e Henderson traz as pesquisas com células-tronco de volta ao ponto onde estavam em 2005. Naquele ano, o pesquisador coreano Woo-Suk Hwang havia anunciado a obtenção desse mesmo tipo de célula “personalizada” para pacientes, por meio de clonagem. O avanço não só permitiria estudar suas moléstias com grande precisão em laboratório como poderia levar à produção de tecidos sob medida para transplante. Afinal, com DNA idêntico ao do doente, tais células-tronco não trariam risco algum de rejeição. Bastaria “ensiná-las” a assumir a função do tecido desejado.

O problema é que Hwang fraudou seu trabalho e caiu em desgraça, levando todo o campo de volta à estaca zero. “Por enquanto, os avanços nesse conceito usando clonagem estão totalmente engasgados por causa de problemas técnicos e protocolos de laboratório”, diz Eggan. Ao mesmo tempo, está se fortalecendo a idéia de extrair diretamente as células da pele de uma pessoa adulta e “ensiná-las” a voltar ao estudo flexível e primevo das células de embriões.

Apelidadas de células iPS (células pluripotentes induzidas), elas já foram obtidas diversas vezes, e parecem ser capazes de assumir a função de qualquer tecido, exatamente como as células-tronco embrionárias. O avanço dos pesquisadores foi conseguir a mesma façanha com células da pele de uma paciente idosa, portadora de esclerose lateral amiotrófica, doença caracterizada pela morte progressiva dos chamados neurônios motores. Essas células nervosas controlam os movimentos do indivíduo, e o destino final de quem perde todas elas é a morte, após um longo período de completa paralisia. O célebre físico britânico Stephen Hawking é portador desse mal.

Astrócitos (células ‘auxiliares’ do sistema nervoso) derivadas da pele da paciente (Foto: Kit Rodolfa e John Dimos/Universidade Harvard)

Marcadores claros

Eggan, Henderson e companhia usaram um protocolo considerado já clássico na criação de células iPS: com a ajuda de um vírus, inseriram nas células da paciente quatro genes que as levam a retornar a um estudo mais primitivo e não-especializado. Depois, conseguiram induzir uma subpopulação dessas células, com a ajuda de certas substâncias, a assumir tanto as características de neurônios motores — aqueles que sofrem durante a esclerose lateral amiotrófica — quanto de células de “suporte de vida” dos neurônios, os astrócitos. Isso é importante porque aparentemente os astrócitos produzem substâncias tóxicas durante a doença e, portanto, é preciso estudar o que exatamente eles estão fazendo.

Eggan deixa claro que ainda há um longo caminho a percorrer antes que aplicações práticas da idéia se tornem disponíveis. Um problema ainda sério é a modificação genética — não é seguro inserir células geneticamente modificadas em pacientes humanos. Também não se sabe como corrigir os neurônios obtidos e reinseri-los nos doentes. Mas, no tubo de ensaio, deve se tornar bem mais fácil estudar como a doença progride em pessoas naturalmente predispostas a ela. É um modelo que, em tese, vale para qualquer moléstia.

Fonte: G1

Nenhum comentário: