sábado, 15 de maio de 2010

Nova técnica usa luz para observar funcionamento do cérebro

Por mais intensa que seja, não é possível enxergar diretamente a corrente elétrica que flui através de um fio metálico.

Mas agora já é possível enxergar a eletricidade fluindo ao longo das células nervosas do cérebro, em um feito que deverá dar um impulso inédito no estudo da fisiologia cerebral e das atividades neurais associadas com o comportamento.

Potenciais de ação

Um grupo de cientistas do Japão e da Suíça usou uma proteína fluorescente para acompanhar a atividade elétrica no interior dos neurônios de uma cobaia viva.

Os neurônios comunicam-se uns com os outros por meio dos chamados potenciais de ação. Durante um potencial de ação, uma diferença de potencial elétrico faz abrir canais de cálcio, causando um rápido influxo de íons de cálcio.

Esse acoplamento preciso entre o disparo do neurônio e o movimento dos íons permite que proteínas fluorescentes funcionem como indicadores dos potenciais de ação.

Proteínas camaleão

Essas proteínas especializadas têm duas subunidades fluorescentes, uma que irradia luz amarela e outra que irradia luz azul.

Quando as proteínas se ligam ao cálcio, a proporção entre a emissão de luz amarela e de luz azul varia, indica diferentes níveis de cálcio.

Essa variação de cores explica porque os cientistas chamam essas proteínas de "proteínas camaleão".

Usando uma nova variedade de proteína camaleão, chamada YC3.60, os cientistas conseguiram gravar a reação a estímulos sensoriais das células nervosas do cérebro intacto de camundongos.

Cada vez que os bigodes dos animais eram flexionados por uma corrente de ar, observava-se uma mudança nas cores da proteína camaleão nos neurônios das áreas sensoriais do córtex.

Vendo o cérebro funcionar

"A proteína camaleão YC3.60 nos permite medir os potenciais de ação não apenas de fatias de tecido cerebral in vitro, mas também em um cérebro intacto. A molécula reage rapidamente e com grande sensibilidade, e ainda detecta alterações nas concentrações de cálcio ocorrendo mesmo em sequências muito rápidas," diz o Dr. Mazahir Hasan, do Instituto Max Planck de Pesquisas Médicas.

A técnica permite o rastreamento da atividade elétrica tanto em neurônios individuais quanto em agrupamentos funcionais de células. "O que é mais vantajoso é que nós podemos medir simultaneamente a atividade de redes neurais ou de regiões inteiras do cérebro," afirma Hasan.

O próximo passo que os cientistas pretendem dar é introduzir proteínas camaleão seletivamente em camadas corticais específicas ou em diferentes tipos de células nervosas, o que permitirá compreender como as diferentes células nervosas presentes nos circuitos do cérebro geram comportamentos complexos.

Medindo sem eletrodos

As proteínas duplamente fluorescentes poderão revolucionar o estudo da atividade elétrica do cérebro, permitindo literalmente que se veja o cérebro funcionar em animais vivos - e, no futuro, eventualmente também em seres humanos.

Até hoje, a única forma que os cientistas têm para fazer isso é inserindo eletrodos nas células ou nos tecidos nervosos. Mas essa técnica, além de danificar os tecidos, não dá informações sobre os diferentes tipos de células nervosas.

Já as alterações de cor das proteínas camaleão podem ser observadas de forma muito menos invasiva, usando fibras ópticas ou com a ajuda dos modernos microscópios de fluorescência - conhecidos como microscópios de rastreamento por laser de dois fótons.

Informação genética

Outra grande vantagem da nova técnica é que as proteínas camaleão podem ser formadas no interior das próprias células a serem observadas, bastando que uma seção correspondente de DNA seja inserida previamente no genoma.

Em dois experimentos realizados pelo grupo de cientistas, vírus foram utilizados como veículo para levar a informação genética das proteínas camaleão para as células nervosas.

Esta nova técnica, de observação do cérebro com luz, fornece uma ferramenta sem precedentes para estudar como as memórias se formam ou são perdidas.

Ou onde e como os padrões de atividades cerebrais são alterados durante o envelhecimento ou na ocorrência de doenças neurológicas, como Alzheimer, Parkinson e esquizofrenia.

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