Cientistas descobriram como a informação epigenética - a parcela de 99% do genoma que não codifica proteínas - se propaga durante a divisão celular e como esse processo é subvertido no câncer.
Todas as células de um organismo têm o mesmo DNA, mas cada uma delas é especializada para uma função específica. Isso ocorre porque as alterações epigenéticas garantem essa diferenciação.
"No câncer, esse processo é subvertido. A metilação ocorre em locais errados, desligando genes que deveriam suprimir o tumor, permitindo assim que ele ocorra", explica o brasileiro Daniel Diniz de Carvalho, atualmente na Universidade do Sul da Califórnia, onde a pesquisa foi realizada.
Metilação
A metilação é o principal mecanismo epigenético: um grupo metil é transferido para algumas bases de citosina do DNA. O processo é fundamental para "desligar" os genes que provocam alterações na transcrição genética.
Mas, com base nos modelos utilizados até agora, não se sabia exatamente como a metilação é mantida, nas células saudáveis, em locais exatos do DNA durante as divisões celulares. "Nosso principal achado se refere exatamente a isso: como as metilações aberrantes não ocorrem na célula normal", disse.
Duas enzimas são responsáveis por controlar o mecanismo de metilação: a DNMT3A e a DNMT3B. Ambas podem metilar o DNA em qualquer lugar. "Essas enzimas são perigosas, já que podem desencadear a metilação em lugares onde ela não devia ocorrer", afirmou.
As duas enzimas só conseguem ser estáveis quando estão "ancoradas" no nucleossomo que contém DNA metilado. Isso permite um mecanismo homeostático que faz com que as enzimas só ocorram nessa região. "Descobrimos que, no tumor, uma dessas enzimas se desgarra do nucleossomo e fica livre no núcleo. Com isso, ela consegue metilar lugares do DNA que não deveriam ser metilados", disse.
Seguindo as pistas
Os pesquisadores descobriram também que o desprendimento da enzima ocorre por causa de uma deleção da proteína: um trecho da enzima é perdido e permite que ela possa se estabilizar fora do nucleossomo.
"Mas o mais importante foi descrever o mecanismo de como, em situação saudável, ocorre a manutenção dos padrões normais de metilação do DNA. Com a divisão celular, esse padrão precisa ser transferido para a célula filha de forma fiel. Conseguimos descrever como esse mecanismo se mantém com tal fidelidade", disse Carvalho.
As enzimas, segundo o cientista, precisam ficar ancoradas no nucleossomo. Esse mecanismo regulatório é o que permite a propagação fiel e impede que ocorram metilações aberrantes.
"Vamos tentar entender melhor como a célula tumoral consegue superar esse mecanismo. Chegamos às primeiras pistas: a deleção de deltaisoformas da enzima, que permite que ela se desprenda do nucleossosmo. Agora, queremos entender como o tumor consegue driblar esses mecanismos de controle que descrevemos", afirmou.
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Fonte: Agência Fapesp
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