Agora, cientistas da USP desenvolveram um programa que pode fazer este trabalho automaticamente, de forma mais rápida e mais precisa.
O programa poderá se tornar uma ferramenta poderosa de auxílio dos diagnósticos por imagem.
Mineração saudável
O MIRVISIM, sigla em inglês para Mineração, indexação, recuperação e visualização de dados em sistemas de arquivamento de imagens médicas, foi desenvolvido por um grupo coordenado pela professora Agma Juci Machado Traina, do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação, em São Carlos.
A função do sistema é comparar a imagem a ser analisada pelo radiologista com um banco de dados formado por outras já avaliadas por um perito. Características como cor, posição e formato dos elementos retratados são indexadas e utilizadas como elementos a serem comparados.
O especialista então recebe uma série de sugestões de diagnósticos que foram levantados em casos similares ao do analisado.
Medicina informatizada
"É comum o médico se lembrar de ter visto uma imagem parecida, mas não se recordar de quem era o paciente nem dos detalhes do caso", disse Agma.
Buscar por exames antigos é uma tarefa árdua e pode tomar muito tempo do especialista. Essa tarefa é realizada pelo MIRVISIM em questão de minutos, com base em um banco de dados tão grande que seria inviável para um ser humano acessá-lo sozinho em tempo hábil.
Para elaborar o protótipo, a equipe utilizou um banco de cerca de 3 mil imagens de ressonância magnética de duas dimensões, vindas de várias partes do corpo humano e em diversos cortes e posições.
A primeira dificuldade enfrentada pelos pesquisadores foi a indexação de dados complexos representados pelas imagens médicas. "Foi preciso detectar a essência da imagem, que só o especialista está apto a capturar", disse Agma.
Um dos principais desafios foi escolher detalhes importantes em meio a um volume muito grande de informações. Essa seleção é conhecida como mineração de dados.
Imagens do cérebro
O trabalho inicial com as imagens fez parte da pesquisa de doutorado de André Guilherme Ribeiro Balan. Ao analisar ressonâncias magnéticas de cérebros, ele segmentou as imagens geradas em regiões específicas, cada uma contendo quatro características.
Uma imagem segmentada em dez regiões, por exemplo, reúne 40 características que formam um vetor. "O vetor é a síntese das características da imagem", disse Balan, que atualmente é professor do Centro de Matemática, Computação e Cognição da Universidade Federal do ABC.
Cada vetor é classificado por similaridade e recuperado quando uma imagem semelhante está sendo examinada pelo médico. Entre as características levantadas estão o nível de cinza médio, o centroide (centro geométrico) e a chamada "dimensão fractal" que informa o formato de um objeto por meio de uma única medida.
Mineração de dados
Boa parte da mineração de dados desenvolvida na pesquisa foi executada no doutorado de Marcela Xavier Ribeiro. Ela desenvolveu um sistema de sugestões de palavras-chave para diagnósticos de mamografia.
Ao ser aplicado em um grupo de imagens já laudadas, o MIRVISIM apresentou um índice de 95% de acertos. "Foram sugestões que coincidiram com os diagnósticos dos especialistas", afirmou Agma.
A professora do ICMC estima que o sistema possa aumentar a qualidade dos laudos ao ampliar a gama de escolhas do radiologista. Por depender muitas vezes da própria memória, esse especialista pode esquecer de quadros raros ou de pouca incidência.
Como encontrar coisas perdidas
Essa dificuldade humana de detectar objetos raros foi recentemente destacada em estudo publicado na revista Current Biology, conduzido por Jeremy Wolfe, professor da Escola de Medicina de Harvard, nos Estados Unidos.
Ao estudar o índice de detecção de armas em malas por meio de aparelhos de raios X de aeroportos, Wolfe verificou que quanto menos o observador se depara nessa atividade com o objeto que procura - no caso armas ou bombas - menor será a probabilidade de encontrá-lo - veja os detalhes na reportagem Por que nem sempre encontramos o que estamos procurando?
Segundo o pesquisador norte-americano, a dificuldade de encontrar alvos raros é comum nos ramos profissionais que atuam com análises visuais de imagens. Ele inclui nesse grupo os médicos radiologistas, acostumados a olhar centenas de imagens diariamente.
Nesse sentido, o MIRVISIM pode preencher essa lacuna ao considerar detalhes pouco comuns que o especialista tenderia a ignorar.
Doenças por região
O sistema pode ir além do auxílio diagnóstico e ser empregado em modelos estatísticos para fazer relações difíceis de serem traçadas. Ele é capaz, por exemplo, de associar a incidência de manchas no pulmão ao endereço residencial ou à profissão do paciente e assim estabelecer relações entre as enfermidades e determinadas áreas geográficas ou atividades profissionais.
Para desenvolver o MIRVISIM, o grupo de São Carlos trabalhou em parceria com colegas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, que testaram o sistema em exames de mamografia.
Formação de especialistas
Além de auxiliar na prática médica, o protótipo testado em Ribeirão Preto também se mostrou ferramenta eficiente de auxílio na formação de novos especialistas.
Alunos de graduação utilizaram o sistema como um banco de consultas para o aprendizado de diagnósticos e médicos residentes o aplicaram para aferir e aprimorar o relatório provisório que deve depois ser aprovado ou corrigido por um docente ou por um médico assistente.
"Ele agiliza e melhora a qualidade do diagnóstico", disse o professor Antonio Carlos dos Santos, da Divisão de Radiologia do Departamento de Clínica Médica da FMRP. Para ele, o auxílio automático serve como contrapeso à opinião pré-formada que muitas vezes o médico leva na hora de examinar as imagens.
"A aceitação no meio médico foi tão grande que, durante um workshop do MIRVISIM no fim de janeiro, vários especialistas em diagnósticos pediram a ampliação da ferramenta para a análise de outros sete tipos de imagens médicas além da mamografia e da ressonância magnética", disse Agma.
Fonte: Diário da Saúde
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