sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Sequenciamento genético mostra suas forças e suas fraquezas

Na semana passada, a criação de um nanoporo artificial mereceu destaque em nossa primeira página, quando a equipe do Dr. Peixuan Guo usou o motor biológico de um vírus para construir uma espécie de furadeira biológica, capaz de fazer furos pelos quais pode passar uma única molécula de DNA de cada vez - um nanoporo artificial.

Na ocasião, o Dr. Peixuan predizia as possíveis aplicações dos nanoporos: "A possibilidade de fazer a molécula de DNA viajar através do nanoporo, avançando nucleotídeo por nucleotídeo, poderá levar ao desenvolvimento de aparatos de sequenciamento de DNA com um único poro."

Sequenciador de DNA

A IBM gostou da ideia e anunciou que vai juntar cientistas seus de quatro especialidades - nanofabricação, microeletrônica, física e biologia - para construir seus próprios nanoporos artificiais e, prevê a empresa, reduzir o custo do sequenciamento do DNA para algo entre 100 e 1.000 dólares. Para se ter uma ideia, o primeiro sequenciamento feito pelo Projeto Genoma Humano custou 3 bilhões de dólares.

Em vez de trabalhar com membranas de gordura, como o Dr. Peixuan, os cientistas da IBM, como não poderia deixar de ser, vão fazer seus nanoporos em chips de silício, dispensando os motores virais e usando as técnicas de fabricação da microeletrônica para fazer os minúsculos furos.

O plano é construir um sequenciador de DNA em nanoescala, que a empresa está chamando de "transístor de DNA" - uma associação bastante inadequada, uma vez que o nanossequenciador em nada lembrará um transístor, a não ser pelo fato de que vários desses nanoporos residirão em uma pastilha de silício.

Acelerador de DNA

O grande desafio, ainda a ser vencido, é controlar a velocidade com que a molécula de DNA passa através dos nanoporos, de forma que os sensores possam decodificar o que está nesse DNA de forma precisa e confiável.

Os cientistas da IBM acreditam ter uma ferramenta adequada para isso. Eles projetaram um material formado pela superposição de nanocamadas de materiais metálicos e isolantes. Será nessa nanoestrutura multicamada que eles farão seus nanoporos.

O ajuste fino da tensão elétrica entre as camadas metálicas deverá permitir o controle preciso do campo elétrico no interior do nanoporo. Utilizando a interação desse campo elétrico ajustável com as cargas elétricas discretas ao longo da molécula de DNA, o dispositivo deverá ser capaz de aprisionar a molécula de DNA no interior do nanoporo.

Ao alternar as tensões entre as diversas camadas, os cientistas demonstraram - teoricamente e por meio de simulações em computador - que a molécula poderá ser movimentada no interior do nanoporo a uma velocidade de um nucleotídeo por ciclo - uma velocidade que os cientistas da IBM acreditam que será baixa o suficiente para permitir a decodificação do DNA.

O próximo passo, essencial, é demonstrar que tudo isto funciona na prática.

Promessas

Se funcionar - seja com a solução biológica do Dr. Peixuan ou com a solução hard da IBM - e se de fato o custo do sequenciamento genético cair a menos de mil dólares, as previsões de uma medicina personalizada poderão começar a ser testadas. A maior promessa feita por esse campo emergente é a determinação rápida da predisposição de uma pessoa a uma determinada doença ou, e eventualmente mais importante, a um determinado medicamento.

"Em última instância, isto poderá melhorar a qualidade dos tratamentos médicos, permitindo identificar os pacientes que terão os maiores ganhos pelo uso de um determinado medicamento e aqueles que têm o maior de risco de sofrerem efeitos colaterais," afirma Gustavo Stolovitzky, o cientista que está chefiando a equipe que quer criar o "transístor de DNA".

O DNA não tem todas as respostas

É certo que a expectativa quanto à construção de uma ferramenta assim é grande, embora já tenha sido muito maior no passado - o sequenciamento do genoma humano trouxe benefícios para a ciência, mas benefícios que nem de longe comparam-se às promessas e às expectativas geradas quando do início do Projeto Genoma Humano.

O fato é que o DNA não tem todas as respostas, como a ciência chegou a acreditar. Coincidentemente, em um artigo publicado hoje na revista Science, dois pesquisadores, um suíço e um norte-americano, constatam que, embora o progresso nas tecnologias do sequenciamento do DNA já esteja se aproximando da versão da genômica mostrada em filmes de ficção científica, como Gatacca, a promessa de prever o risco que cada indivíduo tem de sofrer de qualquer doença ainda não se realizou.

"Como é que vamos preencher essa lacuna? Ou será que já é hora de reconsiderar o objetivo de predizer com precisão o risco individual [de doenças]?" perguntam eles. Provavelmente sim. Pelo menos é o que nos leva a concluir a enorme lista de problemas e desafios que os cientistas citam em seu artigo, além da insuficiência de uma abordagem centrada unicamente no DNA.

Ganhos em humildade

O grande problema é que os estudos do genoma somente identificam genes "candidatos a vilão" e é necessário ter-se em conta um quadro muito mais amplo para definir a participação de uma determinada sequência de DNA sobre a saúde de alguém - e mesmo se ela tem participação. A Biologia ainda está por assistir à sua própria revolução holística.

A conclusão dos dois cientistas é clara e surpreendente: "Uma meta factível de saúde pública que merece destaque é identificar, para cada indivíduo, fatores no seu estilo de vida que representem riscos particularmente elevados de doenças crônicas."

E todas as pesquisas genéticas e as promessas derivadas da decodificação do DNA? As pesquisas deverão certamente prosseguir e continuarão trazendo benefícios, embora a conta-gotas. Mas cuidar do estilo de vida talvez seja, por enquanto, uma medida mais concreta e mais realista.

De resto, as pesquisas com o DNA já trouxeram um benefício impagável: a constatação de que a vida é mais complexa do que meras comparações com computadores podem levar a crer, o que dá à Ciência um grande ganho em termos de humildade. E essa virtude, que nos permite o reconhecimento da nossa fraqueza, é a mesma que nos impele para a aquisição da força e da sabedoria que nos faltam.

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