segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Veneno de aranha pode virar remédio contra epilepsia

Para paralisar ou matar uma presa ou predador na natureza, as aranhas utilizam poderosos venenos, capazes de atingir funções vitais de seus alvos mesmo com pequenas doses.

Ao estudar as toxinas desses organismos para conhecer melhor como elas agem, os cientistas estão descobrindo compostos que podem ser tornar potenciais medicamentos para o tratamento de doenças encefálicas, como a epilepsia.

"Há quase quatorze mil patentes de toxinas de animais com aplicação biotecnológica depositadas no escritório de patentes norte-americano, o USPTO," conta o professor Paulo Sérgio Lacerda Beirão, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

"Mas ainda há uma enorme possibilidade de se obter outras moléculas com potencial biotecnológico", afirmou o especialista no simpósio sobre a biodiversidade e biotecnologia de venenos no Brasil, durante a Reunião Anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência).

Veneno de aranha contra epilepsia

De acordo com Beirão, estima-se que, das 38 mil espécies de aranha existentes no mundo, cerca de 500 tenham potencial para compostos com alguma atividade biológica, como inibir a transmissão neuromuscular - as sinapses, pelas quais os sinais eletroquímicos são transmitidos de neurônio para neurônio.

Em função disso, alguns desses compostos estão sendo apontados como fortes candidatos a novos medicamentos para o tratamento de doenças encefálicas, a exemplo da epilepsia.

A doença degenerativa, que atinge 5,3 milhões de pessoas só nos EUA, é caracterizada por uma alteração no padrão eletroquímico normal das sinapses que provoca mudanças de comportamento, espasmos musculares e a perda da consciência das pessoas que sofrem do mal.

Moléculas do veneno

Ao estudar, ao logo dos últimos 20 anos, as diversas moléculas que compõem o veneno de uma espécie de aranha comum na América do Sul, a Parawixia bistrata, o professor da USP de Ribeirão Preto, Wagner Ferreira dos Santos, descobriu duas moléculas bastante promissoras para o desenvolvimento de uma nova droga para o tratamento da doença que provoque menos efeitos colaterais nos pacientes do que as existentes no mercado.

Já testadas em em ratos, as moléculas, denominadas Parawixia 1 e FrPbAII, apresentaram efeitos anticonvulsivos, neuroprotetores e antiansiolíticos, ou seja, inibiram as convulsões que caracterizam a doença, protegeram os neurônios de lesões e diminuíram a ansiedade, que costuma preceder os ataques epiléticos.

"As moléculas não curam a doença, mas possibilitam controlar o alastramento da lesão dos neurônios provocada por ela que, à medida que aumenta, faz com que o paciente perca funções como o odor e a fala, entre outras", explicou Santos durante o simpósio.

Veneno sintético

Especula-se que empresas farmacêuticas no exterior já estejam testando os compostos em testes com humanos. Mas, segundo o especialista, ainda estão enfrentando uma série de dificuldades para torná-las viáveis para aplicação em um medicamento, que representa o calcanhar de Aquiles dos pesquisadores brasileiros que desenvolvem pesquisas com o veneno de animais.

"Do ponto de vista da geração do conhecimento nós estamos bem. Já existe um grupo de pesquisadores brasileiros capaz de identificar esses compostos", avalia o professor da UFMG, Paulo Sérgio Lacerda Beirão. "Mas temos uma fragilidade clara na hora de transformar isso em produtos porque o custo é muito alto", conta.

Na tentativa de fazer com que as moléculas da aranha Parawixia bistrata que descobriu possam despertar o interesse de alguma indústria farmacêutica brasileira ou multinacional, atuante no País, o biólogo Wagner Ferreira dos Santos pretende desenvolver modelos sintéticos dos dois compostos e patenteá-los no exterior.

"As empresas querem já ter acesso a sínteses das moléculas de toxinas e que elas já sejam patenteadas, principalmente nos EUA e na Europa, para utilizá-las", afirma. "Se a molécula só é patenteada no Brasil não tem valor nenhum", comparou, se referindo ao fato de que o mercado farmacêutico brasileiro é muito menor do que o americano e o europeu.

Fonte: SBPC

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