Solventes verdes e celulose
Segundo o professor Omar El Seoud, do Instituto de Química (IQ) da USP, os estudos realizados no âmbito da parceria envolvem dois aspectos principais: o uso de solventes "verdes" e de celuloses de diversas procedências, inclusive de bagaço de cana-de-açúcar.
"Os ésteres e éteres de celulose são usados como fibras, filmes, membranas de hemodiálise, aditivos para medicamentos e alimentos, entre outras aplicações," explica ele.
Os solventes "verdes" utilizados nas pesquisas são líquidos iônicos, uma alternativa de baixo impacto ambiental aos solventes convencionais utilizados em processos químicos industriais.
Líquidos iônicos
"Os líquidos iônicos têm maior estabilidade química e térmica. São extremamente seguros, pois não são inflamáveis e praticamente não têm pressão de vapor, e podem ser reciclados novamente no processo. Ou seja, são isentos dos perigos usuais dos solventes orgânicos clássicos, como o etanol ou o tolueno, que representam riscos de fogo, explosão e decomposição", explicou.
O que distingue o novo processo, de acordo com o cientista, é sua realização sob condições homogêneas, ao contrário do processo industrial atual. "Esse aspecto permite melhor controle das propriedades e, por consequência, das aplicações dos produtos obtidos", disse.
Produtos de alto valor agregado
El Seoud conta que o objetivo do uso desses processos não é produzir commodities, como fibras, mas produtos de especialidades, com valor agregado, como membranas de hemodiálise, cuja eficiência de filtração e compatibilidade com o sangue são cruciais. Para isso, é necessário entender e aperfeiçoar cada etapa da reação.
"Embora o Brasil seja um produtor mundial de pasta de celulose para papel, o país não se destaca como produtor de derivados de celulose com valor agregado, em particular aqueles usados nas indústrias de fiação e farmacêutica", disse.
A indústria farmacêutica, por exemplo, utiliza a celulose microcristalina para produzir pílulas, que, além de uma pequena parte de matéria ativa, são compostas de amido e celulose.
Via de mão-dupla
Segundo o professor, enquanto os brasileiros assimilarão conhecimentos dos parceiros alemães no desenvolvimento de produtos desse tipo - tendo em vista o aproveitamento da grande quantidade de celulose disponível no país -, os alemães se beneficiarão da experiência brasileira com filmes derivados de celulose.
"Ganhamos muito com esse trabalho em conjunto. Eles se interessam principalmente pelos nossos trabalhos com celuloses não-tradicionais, visando à substituição da madeira, como o sisal e o bagaço de cana-de-açúcar", disse.
O projeto de colaboração é coordenado por El Seoud, no lado brasileiro, e por Thomas Heinze, do Centro de Excelência em Pesquisa sobre Polissacarídeos da Universidade de Jena.
Recursos humanos em química verde
"Uma das principais metas da parceria é a qualificação de recursos humanos, que ainda são muito incipientes nessa área tão importante. E o principal diferencial do projeto é que ele não se limita à prática tradicional de enviar estudantes brasileiros para o exterior, mas também traz alunos estrangeiros para os nossos laboratórios. Isso vai ao encontro da necessidade de internacionalização das nossas universidades", disse El Seoud.
As primeiras participantes do intercâmbio são Constance Issbrückner, da universidade alemã - que acaba de encerrar um período de três meses de pesquisas na USP -, e Ludmila Fidale, que partiu nesta terça-feira (4/8) para um período de três meses nos laboratórios de Jena.
"Embora existam ainda muitas barreiras a serem vencidas, nossas universidades oferecem boas condições para receber alunos estrangeiros. A vivência com esses estudantes, formados em escolas de pensamentos diferentes, é uma renovação importante para o nosso grupo", afirmou El Seoud.
Síntese de éteres de celulose
Ludmila conta que o trabalho a ser desenvolvido na Alemanha é parte de sua pesquisa de doutorado. "Vou fazer síntese de éteres de celulose nos laboratórios de Jena. Aqui, trabalhamos muito com os ésteres de celulose, mas não temos experiência com éteres. Lá, vou poder trabalhar, nessa linha, com os líquidos iônicos que eles costumam utilizar. Será uma experiência importante, inclusive porque no IQ-USP somos três pessoas trabalhando diretamente com celulose, enquanto em Jena o grupo especializado nessa área é bem maior, com cerca de 25 pessoas", disse.
Ludmila explica que a colega alemã, com quem trabalhou no laboratório do IQ, aproveitou os equipamentos e a experiência dos professores brasileiros. "Ela veio fazer um trabalho de reflectância e, para isso, utilizou sondas que só temos no Brasil. Ela fez todas as medidas aqui e aproveitou bastante o conhecimento do professor El Seoud sobre essas sondas", destacou.
Fonte: Fábio de Castro
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